Texto de Maria Louzada
O pintor nasceu na cidade do Rio de Janeiro, no dia 15 de
outubro de 1913. Aos 13 anos ele desperta e no seu despertar descobre seu mundo interior
cheio de cores. Começa, então, a amar as coisas, as criaturas e as retrata em
suas telas. Anos depois, é homem feito e nada se modifica no seu caminho. Ama
as cores, vive para sua palheta e põe um pouco de amor em tudo que sai de alias
mãos. Aos quinze de dezembro de 1986, falta-nos o artista, deixando para o
mundo sua parcela de estética e beleza. Assim foi Alcides Cruz.
“Segundo Celso Kelly: é indiscutível a vocação de Alcides
Cruz para a pintura. Essa vocação se define na exuberância não exagerada do seu
colorido e na construtividade de suas composições, melhor diria de suas
paisagens. O colorido está alicerçado numa pasta quente, sólida, espalhada com
desenvoltura entre pinceladas e toques enérgicos de espátula e com nuances ricos de tons.”
Recebeu no país que Ihe serviu de berço - o Brasil -
todas as premiações nos Salões Oficiais. Seu trabalho é cheio de conteúdo
humano por vezes sagrado, outras vezes profano, como na vida de todos os
homens: Ele faz questão de não ser diferente de ninguém. E simples e ama.
Foi aluno do Liceu de Artes e Ofícios e fez parte do grupo
da Colmeia dos Pintores do Brasil. Realizou exposições individuais no Museu de Belas
Artes, no Rio de Janeiro, na Bahia e em Galerias particulares.
Figurou em diversas coletivas e na de Michigan recebeu o
diploma do “Teen Age Exchange Program”. Possui um dossier de recortes de
jornais e revistas da crítica especializada do Brasil e do estrangeiro. Sua atuação
junto ao Salão Militar de Belas Artes se faz presente, onde já conquistou todas
as premiações e vem sendo Membro de Júri. Pertence à Sociedade dos Artistas Nacionais, à Sociedade Brasileira de Belas Artes
e é acadêmico de Grau da Academia Brasileira de Belas Artes detentor da cadeira
nº2 – Patronímica de Henrique Bernadelli.
Suas obras figuram no Acervo do Museu Nacional de Belas Artes, Museus e
coleções particulares em Paris, Madrid. Lisboa, Roma e New York. Em 1970
conquistou o Premio de Viagem ao Estrangeiro pelo Salão nacional de Belas Artes quando teve
oportunidade de frequentar os principais Museus de Portugal, Espanha, França,
Inglaterra, Holanda e Itália.
Cursou a Escola Superior de Belas Artes S. Fernando, em
Madrid. Inaugurou à 08 de fevereiro de 1973 uma exposição individual na Casa do
Brasil e mereceu da crítica da Espanha o seguinte conceito: “Un gran pintor brasileño
expone en Madrid” – periódico “Arriba” de 11 de fevereiro de 1973. Em
entrevista a este jornal diz o pintor: “Mi pintura es especialmente expressionista.
Intento plasmar en mis lienzos lo que veo. Me inspira cualquer motivo:
monumentos, elementos de la figura humana, costumbres, trajes típicos.
Todo eso me interesa”.
Morou em Paris - no Quartier Latin – Boulevard Saint
Michel – onde captou elementos para enriquecimento de sua bagagem pictórica. De
Paris, rumou para Londres onde realizou uma individual, sob os auspícios da
Embaixada do Brasil em Londres. Seu quadro “Ezequiel” - do Aleijadinho - figura
no acervo da Embaixada do Brasil em Londres – doado pelo artista.
Já em Roma ingressa, por concurso, na Accademia di Belle
Arti di Roma.
Alcides Cruz vem militando nas hostes das Artes Plásticas
há mais de um quartel de século, havendo sido premiado com várias honrarias e
distinções, inclusive no estrangeiro quando de sua Viagem-Prêmio. O cabedal
artístico que ele trouxe para o nosso meio é de incomensurável valor na
atualidade e na integração de nossa Arte no cenário internacional.
Conviveu no grupo do café Gaúcho com os companheiros:
Sylvio Pinto, Bustamante Sá, Pancetti, Chlau Deveza, Casemiro, Solon Botelho,
Manoel Faria.
No “Porão” (Museu Nacional de Belas Artes) – com o grupo
de Odete Barcelos, Aurélio D’Alincourt, Helios Seelenger, Luly de Carvalho,
Oswaldo Teixeira, Geraldo Noce, escultores Barreto e Marmura além de poetas e jornalistas
Pereira Reis. Álvaro Ladeira e H. Pereira da Silva.
No momento atual (1986) frequenta o ateliê de modelo vivo
na Sociedade Brasileira de Belas Artes. Sua palheta não cessa na criação de
corpos desnudos, sensuais, não eróticos, porque ele sabe bem distinguir â posição
da Arte em seu trabalho. Eis a compensação do Artista: reviver em suas telas
toda a exuberância de vida que a natureza teima em roubar aos homens. O tempo passa e Alcides Cruz continua na sua obstinação pela
Arte - porque para ele - a Arte é mais forte que a morte!
Em entrevista com o Artista arrisquei a pergunta:
- E a nova fase? Existe coerência com o trabalho anterior?
- O New Look? Sem dúvida que sim. New Look é a nova
visão. É a volta ao passado. É o top
less, o negro e a loura, o bas fond e a vida noturna atual; é o chapéu de
palhinha, a volta dos rostos barbudos... É uma pintura picaresca.
A malícia que se adivinha está envolta em véus e compete
ao espectador decifrar o enigma da Esfínge.
No dizer de E. Victor Visconti “são conjuntos de figuras
humanas num jogo complexo de variadas expressões: medo, angústia, revolta e
arrebatamento; é uma sinfonia de emoções, mostrando toda a gama dos mistérios
do Ser”...
Essas figuras emergem em catadupas, numa criação onírica
e imperiosa se tornam... Figurou com dois trabalhos desta fase no 1º Salão de
Artes Plásticas Cândido Portinari - da Secretaria Municipal de Cultura.
Esta fase vai ficar como um retorno do Artista às suas
raízes: homem criado a céu aberto, no campo, nas velhas fazendas de café de
seus antepassados. Suas lembranças abraçam o tempo em que, menino franzino, conhecia
todos os segredo; de Andrade Costa, Vila Rica, Valdarno, Stª Ignez, Água Santa, Cedro, Stª Helena,
Cavaru, Catete... De manhã bem cedo gostava de acompanhar Jovelino para a
ordenho das vacas. O cheiro do mato, da terra molhada do orvalho da noite estão,
agora, mais do que nunca impregnados em sua alma.
“Eia. boi de cambão!!! João Onofre era o carreiro mais
antigo do engenho lá de casa”. Cleómenes Campos
O progresso veio vindo, levando de roldão vidas, esperanças
e ilusões da gente. Foram retalhados as fazendas e no chão outrora molhado com
o suor do negro-irmão, pode-se ver os sulcos dos pneus das máquinas modernas devorando
o tempo.
Neste retorno, Alcides Cruz assume um ar de quem já
desvenda o final do século. Porque, em verdade, nada de novo existe na
superfície da terra. Estamos num imenso cadinho a experimentar todos os
temperos para o banquete final. “That's the question”: Aproveitar enquanto o Amor existe.
Num toque de mágica algo irá ficar para contar a história
de Alcides Cruz – o pintor.